terça-feira, 21 de agosto de 2012

Levante-se, UFBA! Para enfrentar as limitações à frente, de mãos dadas com a nossa gente!



Salvador, 20 de Agosto de 2012

Nos últimos meses, o Brasil tem vivido um momento histórico de greve da educação. Desde maio de 2012, diversas Instituições Federais de Ensino paralisaram suas atividades, chegando ao expressivo somatório de mais de 95% das Universidades Federais do país em luta por um ensino de qualidade. Estudantes e servidores públicos – docentes e técnicos-administrativos – têm tomado as ruas e as Universidades para reivindicar melhores condições de trabalho, reajuste salarial, a não adesão dos Hospitais Universitários à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), os 10% do PIB para a educação, maiores investimentos públicos direcionados à assistência estudantil e tantas outras pautas que unem estas três categorias. Todos estes setores da educação pública superior afirmam que o modelo de Universidade elitista e excludente ainda existente no Brasil não acumula para o projeto de nação que defendem, sob o qual todos os cidadãos têm direito a educação de qualidade e o dever de produzir conhecimento socialmente referenciado.
É nesse contexto que nós, do Levante Popular da Juventude, inserimo-nos no processo de lutas por uma educação que sirva ao povo brasileiro. Reafirmando, através da prática, o nosso compromisso na construção de um Projeto Popular para o Brasil. Aos lutadores e lutadoras do povo que permanecem em luta por uma educação emancipadora, segue nossa contribuição elaborada como síntese coletiva para o conjunto da sociedade.

Greve geral em toda Federal!

Na Universidade Federal da Bahia (UFBA) não foi diferente e o grito que ecoou há cerca de dois meses na assembleia geral dos estudantes da UFBA, proferido por aproximadamente dois mil pulmões, foi o de “greve geral em toda federal!”. É importante salientar que a conjuntura da greve estudantil na UFBA apresentou alguns obstáculos aos seus atores e atrizes – afinal, esta configurou uma paralisação às portas do final do semestre letivo. Surpreendendo inúmeros estudantes devido à greve e, consequentemente, a agitação em volta das suas pautas não ter sido construída antes da sua deflagração. Entretanto, mesmo diante das adversidades, nas assembleias de grande parte dos cursos, chegou-se ao entendimento de que a educação do país estava em greve pela qualidade necessária ao seu funcionamento e que nós, estudantes, também deveríamos ser sujeitos deste processo. 
As Universidades Federais de todo o Brasil viveram, através do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - REUNI, um processo contraditório de expansão. É inegável a importância do processo de criação de cursos noturnos, de novas opções de cursos e do aumento do número de vagas para a democratização e maior acesso da população às Universidades Públicas. Porém, por este processo de crescimento não ter sido acompanhado proporcionalmente por um aumento no quadro dos servidores públicos (dentre professores e corpo técnico), de investimento em infraestrutura para que os cursos funcionem com qualidade e, de mais verbas para a assistência estudantil garantindo a permanência do povo na Universidade, a expansão caracterizou-se mais como um inchaço. Acarretando diversas limitações que os campi universitários e o ensino público superior sofrem atualmente – constituindo a greve uma forma extrema de protestar acerca desta realidade também extrema em torno da educação superior pública brasileira.
 Além disso, no semestre de 2011.2, o movimento estudantil da UFBA viveu um momento de grande efervescência política e organizativa, o que gerou uma carta com inúmeras pautas locais e nacionais e alguns compromissos assumidos pela Reitoria que foram desrespeitados - a exemplo dos Restaurantes Universitários de São Lázaro e Canela e da circulação do ônibus intercampi (BUSUFBA), que teoricamente seriam cumpridos até os meses de março e abril deste ano. 
Diante deste cenário, o movimento estudantil amadureceu o posicionamento de que motivos não faltavam para a construção de uma greve discente e que o processo deveria ser encarado como uma nova forma de ocupar os espaços da Universidade – promovendo debates, fazendo agitação e propaganda em volta de suas reivindicações, protestando nas ruas e até mesmo tomando atitudes mais radicais (como foi a ocupação da Fundação de Apoio à Pesquisa e à Extensão - FAPEX, onde é administrado boa parte do dinheiro da UFBA). Assim, a greve deveria ser o momento dos estudantes conquistarem pautas concretas, reivindicarem um novo projeto de Universidade e de sociedade, além de acumular um saldo organizativo e político para continuar disputando a Universidade – como um importante espaço de construção de saberes e formação de profissionais e cidadãos - pois o fim da greve não seria o fim da luta. Muito pelo contrário, seria parte do processo de acúmulo de força para que ela continuasse cada vez mais forte.

O que foi feito nestes dois meses de greve?

Foram dois meses de mobilização e de muito debate em volta de pautas e temas essenciais para a construção de uma Universidade socialmente referenciada, democrática e popular. A assistência estudantil deixou de ser a fatia desprovida e relegada da UFBA para ganhar evidência e ser uma das protagonistas na greve dos estudantes, pois apoiamos e defendemos a democratização da Universidade. Queremos os seus portões escancarados para a população: quem de fato a sustenta com o pagamento de impostos, mas paradoxalmente não tem a oportunidade de receber uma educação de qualidade e muito menos condições materiais de ingressar (uma taxa de cem reais é cobrada para se inscrever no vestibular da UFBA) e se manter em uma Universidade Federal.
Também fizemos espaços formativos acerca da importância da extensão universitária torneada de uma concepção popular; ou seja, que estabeleça uma relação dialógica com a sociedade, ao invés de apenas levar o saber para comunidades e/ou utilizar-se delas como material de estudo. A extensão nas Universidades deve cumprir o papel essencial de reoxigenar a pesquisa e o ensino, trazendo a realidade concreta como principal matéria-prima para a construção do conhecimento. As atividades de extensão permitem que o saber popular adentre o ambiente acadêmico e fazem com que a Universidade produza conhecimento socialmente referenciado, com o povo e não para ele, utilizando-se do investimento público para promover saúde, educação, desenvolvimento da agricultura familiar e tantas outras atividades visando um Brasil menos injusto e a conformação de uma Universidade que forme cidadãos críticos e transformadores da sua realidade.
A luta contra a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) também teve grande centralidade nas discussões do movimento grevista dos três setores, pois o sucateamento cada vez maior dos Hospitais Universitários por falta de investimento público não pode ser resolvido através da privatização dos mesmos. Os HUs compõem a maior rede de hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) - com 46 hospitais em todo o Brasil - sendo, portanto, instrumentos indispensáveis para a garantia da saúde de grande parte da população do nosso país. A implantação da EBSERH ameaça a autonomia universitária, prejudica o aprendizado e as práticas de extensão dos estudantes da área da saúde, faz transferência da gestão estatal para as mãos da iniciativa privada e acaba por cercear o direito do povo à assistência à saúde. Dizemos não à EBSERH e a qualquer tentativa de privatização da saúde do nosso país.
Além dos espaços de formação política em volta das pautas estudantis, de manifestações e atos, tanto locais como nacionais, que reivindicavam tais pautas, os estudantes buscaram diversos espaços de diálogo com a administração central da UFBA: através do envio de carta com as pautas elencadas, da disputa de espaços institucionais como o Conselho Universitário (CONSUNI) e o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONSEPE) e da audiência pública com a Reitoria. Apesar do reconhecimento da nossa greve e da garantia da reposição das aulas, a Reitoria não apresentou soluções efetivas para as demandas dos estudantes.
Foi preciso radicalizar o movimento, com a ocupação da FAPEX, para que a administração central da UFBA entendesse que as reivindicações estudantis tinham caráter de urgência e mereciam todo o afinco da Reitoria para serem concretizadas. Assim, foi-nos entregue o edital do BUSUFBA, a licitação para que o campus de Vitória da Conquista receba alimentos através de uma distribuidora, documentos referentes aos Restaurantes Universitários de São Lázaro, do Canela e da Politécnica, além do diálogo em torno de outras demandas estudantis – como a necessidade de iluminação à noite no campus de São Lázaro, a possibilidade concreta de que alguns alimentos dos RUs sejam provenientes da agricultura familiar, a obrigatoriedade dos Institutos contabilizarem as Atividades Curriculares em Comunidade (ACC) como disciplinas optativas dos currículos, dentre outras questões.

O movimento grevista obteve conquistas?

A greve construída pelos estudantes da UFBA obteve conquistas concretas, como é o caso de uma pauta histórica do movimento estudantil: o transporte intercampi (BUSUFBA), que já teve edital publicado no jornal A TARDE e no COMPRASNET (sistema de compras do governo federal). Também estão sendo engatilhados – porém ainda demandando um processo de pressão e acompanhamento por parte dos estudantes – os pontos de distribuição de refeições da Politécnica, do Canela e de São Lázaro; alguns com lugares já definidos, verba para a construção e a confecção de seus projetos em andamento. Estas são vitórias da luta dos estudantes para toda a comunidade acadêmica; afinal, os servidores públicos e os trabalhadores terceirizados também se utilizarão destas conquistas. 
Além da conquista de pautas concretas, a greve foi um importante processo político de disputa por um novo projeto de Universidade. Muitos estudantes tornaram-se protagonistas da história e dos rumos não só da UFBA, mas também da educação do seu país. Dessa forma, o movimento estudantil passou por um processo de formação política e organizativa extremamente importante, com a atuação muito forte de Diretórios e Centros Acadêmicos (DAs e CAs), do Diretório Central dos Estudantes (DCE), de diversas entidades e grupos estudantis e com a participação de novos estudantes comprometidos com a transformação da Universidade e da sociedade. Foi comprovado, na prática, que a unidade na ação de diversos setores de esquerda do movimento estudantil é possível e essencial para o avanço das lutas. O fato de ser necessária a proclamação e a efetivação da unidade no movimento estudantil já evidencia que, dentro deste, existe uma heterogeneidade de concepções e métodos, porém tal realidade não pode ser caminho para a autoproclamação e disputa fratricida entre coletivos e entidades. Transformações estruturais na educação brasileira só serão efetivadas através do acúmulo de força social; e para isso, torna-se imprescindível a construção da unidade.
Sendo assim, aproxima-se o momento em que o calendário acadêmico da UFBA terá prosseguimento, com mais estudantes ingressando na Universidade e usufruindo das conquistas e acúmulos do movimento estudantil nessa greve. Contudo, ainda viveremos as inúmeras contradições, problemas e limitações existentes na Universidade Pública. Nesse sentido, será imprescindível utilizar-se do saldo organizativo/político conformado nesse período de paralisação para dar prosseguimento à luta por uma Universidade Pública do/para o povo, que produza conhecimentos e práticas socialmente referenciadas e que forme profissionais-cidadãos comprometidos com a transformação da sua realidade. O movimento estudantil, utilizando-se da criatividade e de novos métodos de luta, com unidade na ação e interesse conjunto de construir um novo projeto de nação, terá muito trabalho e mais vitórias pela frente. 





Juventude que ousa lutar constrói o Poder Popular!